Que a bicicleta é mais rápida que o carro, já não é novidade. Mas chegar antes do helicóptero foi uma surpresa até para mim.

Ricardo Bruns e sua bicicleta: mais rápido que um helicóptero
Foto: Marcelo Pereira/Terra

O maior objetivo do Desafio Intermodal é mostrar que existem outras opções além do automóvel para se deslocar numa grande cidade como São Paulo. Ir de ônibus ou Metrô até algum lugar não é tão mais demorado que o carro (imagine então se tivéssemos corredores de verdade e o mesmo investimento em transporte público que temos para o uso do automóvel). E o conforto oferecido pelo carro é relativo: eu prefiro ficar uma hora em pé num ônibus do que uma hora dirigindo em um trânsito travado. E nem vamos falar aqui sobre poluição, nem sobre o custo da viagem: quem tem e mantém um carro sabe o quanto ele custa ao longo de um ano.

Há opções que as pessoas nem cogitam, às vezes sequer imaginam. Com o advento do Bilhete Único, você pode pegar mais de um ônibus (ou integrar com metrô e trem) para chegar onde quer. Você pode pegar um ônibus qualquer que vá mais ou menos para o lado onde você precisa ir, descer numa grande avenida e pegar outro por lá.

Há também a bicicleta dobrável, que pode ser utilizada para chegar até um ônibus ou metrô. Você então a dobra e leva com você até desembarcar, quando ela pode ser montada novamente para chegar ao destino final. E também é possível até mesmo ir a pé por todo um trajeto ou por parte dele, integrando com transporte coletivo. Numa época em que eu morava a 3,5km do trabalho, era comum eu ir a pé, fazendo o percurso em cerca de meia hora.

Tudo é questão de tentar, fazer um teste, começar aos poucos. Às vezes uma pequena mudança, uma experiência que você faz num dia sem pressa, faz você começar a ver as coisas de outro modo e enxergar opções que antes estavam escondidas atrás da cortina do hábito e da rotina.

A bicicleta vencedora

Ricardo Bruns usou uma bicicleta do tipo conhecido como “fixa”. Ao contrário das bicicletas convencionais, os pedais de uma fixa giram junto com o eixo da roda, de forma que se movimentam durante todo o tempo em que a bicicleta está se movendo. São as preferidas dos bikeboys de Nova Iorque.

A bicicleta tinha outra diferença: o guidão mais estreito. Eu já tentei utilizar com a minha bicicleta a Av. Nove de Julho, caminho que o Bruns fez, mas o espaço entre os carros parados é muito estreito e acabei desistindo. E o caminho que eu fiz, subindo a Brigadeiro Luís Antônio, foi mais fácil para mim do que seria para a fixa, já que uma bicicleta desse tipo não possui marchas.

O caminho feito com a bicicleta fixa tinha praticamente a mesma distância do caminho que fiz. Mas era plano e Bruns pegou algumas ruas mais tranquilas pelo Itaim, onde foi possível desenvolver mais velocidade que em meio aos carros parados, desviando dos retrovisores (sem bater neles – até porque isso para um ciclista significa queda) e aguardando as motos que entopem os corredores. Sim, a bicicleta passa onde moto não passa, principalmente com um guidão mais estreito como o da bicicleta que ele pedalava e às vezes as motos entupidas nos corredores impediam minha passagem na Brigadeiro e na JK.

Parabéns ao Ricardo Bruns, que soube escolher bem o caminho e chegou em dois terços do tempo do helicóptero (22 min), inteiro e sem desrespeitar as leis de trânsito. Da minha parte, fiquei satisfeitíssimo em chegar apenas três minutos e meio depois do helicóptero e por ter melhorado o tempo do ano passado em cerca de cinco minutos (nesse ano, completei em 37 minutos).

O bikeboy

O bikeboy – ou bike courier, bike messenger, ciclista de entregas, como queiram – Neto, da Ecobike, chegou apenas 30 segundos depois do motociclista que ficou em segundo lugar e bem antes do motoboy. Isso faz cair por terra a idéia de que não valeria a pena usar um bikeboy para os serviços pessoais e da empresa, porque teoricamente levaria mais tempo. Entregas feitas por bicicletas, com entregadores profissionais, levam o mesmo tempo que as entregas feitas por moto, podem custar menos e não poluem o ar que todos nõs respiramos. Experimente.

O helicóptero

Ponto a ponto, o helicóptero é inegávelmente mais rápido. Mas há mais coias envolvidas no uso do helicóptero do que apenas voar daqui até ali.

Como relata em um ótimo post o jornalista Milton Jung, da rádio CBN, é preciso subir até o heliponto, aguardar o pouso do helicóptero, aguardar autorização para decolagem (pois há congestionamento até de helicópteros em São Paulo!) e respeitar os corredores de tráfego aéreo que existem na cidade. O tempo total foi de 33:30.

Outras surpresas

André Leme, o corredor, completou o percurso bem antes do carro. Sabe quando dizem que “dá vontade de largar o carro e sair correndo”? Pois é: funciona. Leme teve o tempo de 1h06, enquanto o carro levou 1h22 para chegar. Mesmo Laércio Muniz, que foi andando, chegou apenas 10 minutos depois do automóvel. Deixe seu carro em casa e vá a pé.

A bicicleta dobrável integrada com ônibus levou 1h08 para chegar, mostrando uma alternativa interessante para quem não quer pedalar longas distâncias. Ele pedalou até o ônibus, dobrou a bicicleta (o que é feito rapidamente), embarcou com ela numa sacola destinada a isso e, depois de descer do ônibus pedalou mais um pequeno trecho.

Mas o mais inusitado nessa competição foi um PATINETE chegar antes do automóvel. Lucien Constantino fez o tempo de 58 minutos, chegando antes do carro e até mesmo do corredor. E o motorista do automóvel viu o patinete ultrapassá-lo, mas não podia fazer nada para evitar, já que muitos outros carros impediam seu deslocamento.

Transporte público e cadeirante

Não precisamos nem considerar a bicicleta dobrável como transporte público (e poderíamos: afinal, parte do trajeto foi feito de ônibus). Ricardo Toshio utilizou apenas ônibus e teve um tempo de 1h11, contra o 1h22 do carro. Quem utilizou trem e metrô levou 1h24 e trêm e ônibus 1h29.

A cadeirante Flávia Maria Paiva Vital, animadíssima, chegou em 1h48 minutos. Considerando a falta de acessibilidade de São Paulo (poucos trajetos de ônibus adaptados, calçadas intransitáveis, travessias difíceis), não foi tão pior que o carro. Mas a cidade precisa evoluir muito no trato a quem tem restrições de mobilidade, passando a ser mais inclusiva e viável para quem precisa se locomover numa cadeira de rodas.

Resultados

A tabela completa de resultados pode ser conferida no site do CicloBR, clicando aqui. Além dos tempos, há informações sobre o custo e o CO2 emitido por cada participante para completar o percurso. Com o custo da viagem de helicóptero, por exemplo, daria para comprar várias bicicletas…

Mais bicicletas pelo caminho

Uma coisa que notei esse ano é que havia bem mais bicicletas ao longo do caminho. E não estou falando de quem resolveu me seguir não: eram pessoas voltando do trabalho, pedalando sua bicicleta pelas ruas da cidade. A bicicleta tem sido cada vez mais utilizada como meio de transporte em São Paulo, mesmo que não tenhamos iniciativas de larga escala para integrar a bicicleta ao fluxo viário da cidade e aumentar a segurança de quem utiliza esse “modal”. E não precisa ir longe: algumas pequenas iniciativas fariam a maior diferença.

Tá com pressa? Vá de bike, de patinete, correndo, de metrô, de ônibus…